CALVIN GOLDSPINK: (em off)
O caminho
até aqui... ARTHUR:
(puxando uma cadeira) Senta aqui... O
médico disse que você precisa de muito repouso. VERA:
(sentando) Arthur, não vou
ficar agindo como inválida. ARTHUR:
Mas você sabe muito bem o que
ele disse. VERA:
(girando os olhos) Que é uma
gravidez de risco... Agora me conte uma novidade? A do Roger
também foi e olha como ele está hoje? _______________________________________________ ARTHUR:
Foi uma excelente ideia essa viagem
em família, Lucio. Esse ar vai fazer muito bem para a Vera e
o
bebê... _______________________________________________ SILVIA:
Essa criança fofa, nasce
quando? VERA:
(sorrindo e alisando a barriga)
Mês que vem. Estou contando os dias. Logo o Roger se forma e
vai
para a faculdade, vai querer mais sua independência. Esse
pimpolho vai nos revigorar, sabe. Trazer aquele sentimento
maravilhoso
de um ser tão pequeno e dependente de nós. SILVIA:
(sorrindo) Eu entendo muito bem. E
qual será o nome dele? VERA:
(sorrindo) Cayro. _______________________________________________ LUCIO:
O que houve? ARTHUR:
(com as mãos no volante,
tremendo) Alguma coisa está errada... Precisamos levá-la
ao hospital. Lucio olha para o banco do
passageiro.
Vera está chorando, com dor. Abaixo dela, na saia, é
possível ver muito sangue escorrendo. _______________________________________________ ARTHUR:
Mas ela vai ficar bem não
é doutor? Ela e meu filho ficarão bem, não
é? DOUTOR:
(após alguns segundos)
Lamento, mas receio que o senhor terá que se preparar. Um
dos
dois tem grande chance de não sobreviver à cirurgia. A câmera se aproxima do
rosto de
Arthur que fica em choque. Ele abaixa o olhar e fica
boquiaberto. Casa
de
Roger. Vera está na sala, sentada no sofá, assistindo
televisão. Ouve-se a porta abrindo e fechando. Segundos
depois
Arthur aparece. Ele se senta ao lado dela, apreensivo. ARTHUR:
E
então? VERA:
(olhando para a televisão) Então o quê? ARTHUR:
Já que resolveu não atender meus telefonemas, o
mínimo que poderia fazer é não brincar neste
momento e responder de uma vez. VERA:
Não atendi porque não queria te deixar desanimado. ARTHUR:
(entortando a boca, encostand0-se no sofá) Outro alarme
falso
então... Bom, o negócio é esperar o Roger se casar
e nos dar um netinho pra
bajular. VERA:
Pois é... (morde
os
lábios) Mas acho que não. Vera
o
olha e sorri. Arthur imediatamente desencosta do sofá. ARTHUR:
Você estava brincando comigo? Você estava brincando comigo?
Vera
sorri
ainda mais e balança a cabeça, fazendo em sinal de
sim. Arthur arregala os olhos e coloca a mão na barriga da
esposa. ARTHUR:
(emocionado) Isso quer que nós estamos grávidos? VERA:
(feliz)
Estamos grávidos! Arthur
imediatamente
a abraça. Eles permanecem assim por alguns
segundos. Roger aparece na sala. Ele franze as
sobrancelhas ao
vê-los. ROGER:
Quem
morreu? ARTHUR:
(olhando-o) Sua mordomia. VERA:
A
partir de hoje você terá novas responsabilidades por aqui,
mocinho. ARTHUR:
E a
maior delas é ser um bom modelo para o seu irmão. VERA:
Ou
irmã. ROGER:
(incrédulo) Não mesmo.... (se
aproxima de Vera) Você está... Vera
e
Arthur, felizes, balançam positivamente a cabeça. Roger
esboça um largo sorriso. ROGER:
(feliz)
Oh meu Deus, isso é demais! (pensativo)
Vocês não estão um pouco velhos para serem pais
novamente? ARTHUR:
(para
Vera) Eu seria um pai ruim se escolhesse esse pimpolho que
ainda
está em formação, como meu preferido? ROGER:
(rindo)
Estou brincado. Vocês estão na flor da idade ainda. Isso
vai ser demais, demais! VERA:
Por que
estou achando que não ele não está feliz apenas
pelo fato de que vai ter um irmão? ROGER:
É claro que eu estou feliz. Mas estou
feliz também porque agora vocês terão alguém
para dedicar 100%
de
atenção... Liberdade para o Roger. ARTHUR:
Respondido... Ele acha que vai pode aprontar à vontade. VERA:
Como
é inocente esse menino... Muito inocente. (para
Roger) Rapaz, não importa se vamos ter um bebê, você
sempre será nosso bebezão e
sempre vamos estar de olho em você. ARTHUR:
Sempre. ROGER:
(entortando a boca) É, de certa forma estou feliz em saber
que
não serei trocado. ARTHUR:
Abraço em família? VERA:
(sorrindo) Abraço em família! Vera
e
Arthur abrem espaço no meio para Roger sentar-se. Roger
senta
e os três se abraçam, felizes. A imagem começa se
afastar lentamente até que a tela congela. Um
clarão toma conta da tela, deixando-a branca por alguns
segundos. Quando a imagem se desfaz, somos apresentados a um céu
claro com pássaros voando ao fundo.
Casa
de
Roger. Vera está no quarto, sentada na cama, olhando para
um
espelho grande que está na sua frente. Ela parece perdida,
desorientada. Roger se aproxima e coloca a mão no ombro da
mãe. ROGER:
Mãe... Posso te trazer alguma coisa para comer? Vera
não
responde, continuando a olhar para o espelho. Roger
insiste. ROGER:
Mãe? Vera
continua
sem responder. Arthur se aproxima e coloca a mão no
ombro de Roger. ARTHUR:
Deixa
que eu cuido dela. Roger
encara
Vera por alguns segundos. Depois ele abaixa a cabeça e
sai do quarto. Arthur se senta ao lado da esposa. ARTHUR:
Querida, você precisa comer alguma coisa... Faz dias que
não a vejo colocando nada na boca. VERA:
Não estou com fome. ARTHUR:
Você não pode ficar fraca desse jeito. VERA:
E o que
me importa? Quer que eu fique forte pra
quê?
Não sei se você percebeu, mas eu acabei de enterrar meu
filho. O que você espera que eu faça, levante e fique bem? ARTHUR:
Não, não foi isso que eu quis dizer... VERA:
Me
deixe sozinha... ARTHUR:
Vera... VERA:
(exaltada) Eu disse pra me
deixar sozinha! Arthur
concorda
levemente com a cabeça. Ele levanta devagar e sai do
quarto. Vera olha novamente para o espelho. A câmera se
aproxima
de seu reflexo, até fixar-se em seu rosto. Um clarão toma
conta da tela. Quando se desfaz, temos a visão de Vera
deitada
em uma cama hospitalar. Ela abre os olhos devagar,
franzindo as
sobrancelhas, estranhando. A imagem abre mostrando Arthur
sentado em um
sofá perto da janela. Ele levanta o olhar e ao vê-la, vai
ao seu encontro. ARTHUR:
Graças a Deus você acordou. VERA:
Quanto
tempo estou aqui? ARTHUR:
Dois
dias praticamente. Ela
olha
para o lado. Segundos depois fica pensativa e coloca a mão
na barriga. VERA:
O Cayro... Como ele está? (sorri) Como ele é? Arthur
abaixa
o olhar, expressando tristeza. Vera o
olha
com desconfiança. VERA:
Pede
para trazê-lo aqui... Eu quero muito conhecê-lo. ARTHUR:
(sem
saber o que dizer) Vera... VERA:
(séria) Arthur... Onde está meu filho? ARTHUR:
(com
dor, mal conseguindo falar) Vera, houve complicações
durante o parto... Ele
para
de falar. Os olhos de Vera começam a brilhar. VERA:
(incrédula) Não, não... Onde está meu
filho, Arthur? Eu quero ver o Cayro
agora! ARTHUR:
(com
dor) Me desculpa... Eu sinto muito. VERA:
Por que
está me dizendo isso? (levanta)
Eu
quero ver o meu filho. ARTHUR:
(segurando-a) Hei... Você não pode sair da cama ainda... VERA:
(empurrando-o) Sai de perto... Ele está no
berçário, não está? Eu sei que está. Ela
caminha
até a porta. Arthur novamente a segura. Vera tenta se
soltar, desesperada. VERA:
O que
você está fazendo? Me solta! Eu quero o meu filho! ARTHUR:
(segurando-a) Não! (segurando
ainda
mais forte) Não! Vera
o
encara por alguns segundos e depois desaba a chorar.
Arthur tenta se
controlar. VERA:
(chorando) Não... Meu Cayro...
Meu
menininho... Ela
chora
com ainda mais amargura. Arthur a abraça fortemente. O
choro de Vera se torna ainda desesperador. A câmera se
afasta
lentamente. O clarão toma conta de tela outra vez,
voltando para
Vera sentada na cama, de frente para o espelho. Ela abre
bem os olhos,
enfurecida. Pega um objeto no chão e atira contra o
espelho,
quebrando-o. Arthur e Roger entram apressadamente no
quarto,
assustados. Vera deita na cama e se vira do lado oposto de
ambos. Roger
e Arthur se olham, pesarosos. Casa
de
Cláudio. Cláudio está no quarto, sentado na
cama, visivelmente abatido. Ele ainda veste as mesmas
roupas do
enterro. Helen, que também permanece vestida do mesmo
jeito, se
aproxima dele, sentado ao seu lado e acariciando seu
cabelo. Música: Gavin DeGraw -
We Belong
Together CLÁUDIO:
Nós fomos praticamente criados juntos. A dor que ele está
sentindo, é a mesma que estou. (olha
para Helen) Mas sabe o que é pior? Eu não consegui me
aproximar dele. Ele é meu melhor amigo e eu nem sei o que
dizer
num momento como esse. HELEN:
(com
pesar)
Acho que ninguém sabe. Por mais que procuremos palavras
de conforto, nada vai conseguir amenizar a dor que eles
estão
sentindo neste momento. CLÁUDIO:
Eu sei
que não... Mas sinto impotente. HELEN:
Palavras às vezes não é tudo. Mas um abraço
do melhor amigo, isso sim pode significar muito. Cláudio
a
olha e esboça um leve sorriso. Helen segura na mão dele
e a beija de forma carinhosa. CLÁUDIO:
Enquanto isso eu posso receber um abraço de minha melhor
amiga? HELEN:
(sorrindo) Sempre. Ela
o
abraça fortemente. Cláudio retribui na mesma
intensidade, fechando os olhos. Helen também fecha os
olhos. Frente
da
casa de Nicole. O carro de Felipe estaciona. Corta para
dentro.
Nicole está ao lado de Felipe, no banco do passageiro. Gabriel no banco de trás.
Cont. Gavin DeGraw
- We
Belong Together FELIPE:
Estão entregues. GABRIEL:
Obrigado, Felipe. Ele
abre
a porta e sai. Nicole faz menção de sair, mas Felipe
coloca a mão no braço dela. FELIPE:
Posso
falar com você um instante? Nicole
desiste
de sair. Eles se encaram por alguns segundos. FELIPE:
Que
coisa ruim nós presenciamos, não é mesmo?
Especialmente você que estava dentro do carro na hora do
ocorrido... NICOLE:
Não gosto nem de pensar no momento... Foi muito triste. FELIPE:
Mas se
você se sentir mal e quiser conversar, pode me procurar, okay? NICOLE:
(concordando com a cabeça) Okay...
(abre
a porta) Até mais. FELIPE:
Eu
queria falar sobre o que eu disse na praia. NICOLE:
(desistindo de sair) Não há nada a ser dito, Felipe...
Você deixou bem claro que éramos apenas amigos. A culpa
foi minha de ter alimentando alguma coisa. FELIPE:
Mas
não era verdade o que eu disse. Eu gosto de você. Eu quero
ficar com você. NICOLE:
Agora
é um pouco tarde pra isso. O que aconteceu antes e o que
aconteceu agora, só veio provar que a gente não funciona
como casal e nem funcionaria. FELIPE:
Então de repente a gente não tem mais futuro juntos? NICOLE:
Acho que nunca tivemos... Sinto muito. FELIPE
(desanimado):
É... Eu também. Nicole
sai
do veículo, fechando a porta em seguida. Felipe permanece
olhando-a se afastar, entristecido. Após alguns seguidos,
dá partida no carro. A tela escurece. Abre
mostrando
algumas cenas da cidade, cortando para a lanchonete.
Amanda e
David estão em uma mesa do lado de fora do
estabelecimento. Eles
também ainda vestem as mesmas roupas do enterro. Amanda
está com uma expressão distante, deixando o lanche e o
suco que está na sua frente, intacto. David a olha por
alguns
instantes, solidário. Música:
Radiohead
- High And Dry DAVID:
No que
está pensando? AMANDA:
No
Roger... No Arthur... E especialmente na dona Vera. Eu
acompanhei o
começo da gestação, o modo como eles estavam
felizes com a oportunidade de serem pais de novo. (abaixa
o olhar) Eu só queria poder abraçá-los agora. Close
no
rosto de David. Ele sorri de leve e passa a mão no rosto
de
Amanda, carinhosamente. AMANDA:
Eu
não devia estar falando disso com você. DAVID:
E
você acha que eu sou algum insensível? Pode falar à
vontade... Aliás, você deveria ir até o Roger e dar
esse abraço que ele está precisando. AMANDA:
(surpresa) Está falando sério? DAVID:
Claro
que estou... Vocês tiveram uma história juntos. E agora
ele vai precisar de todo apoio possível. AMANDA:
É, mas não acho que eu seja a pessoa que ele gostaria de
ver agora. DAVID:
Num
momento como esse, não há espaço para ressentimentos. AMANDA:
(sorrindo) Você tem uma autoconfiança exagerada, sabia? DAVID:
(sorrindo) Eu sei que o que quer que aconteça, nossa
história ainda está começando. AMANDA:
(colocando a mão na mão dele) Eu gosto de você,
bastante. DAVID:
(sorrindo e acariciando a mão dela) Eu posso dizer o mesmo.
Amanda
sorri.
David pega na mão dela e beija de forma carinhosa. O som
toma conta da cena por alguns instantes. A imagem sobe,
mostrando a
lanchonete numa visão aérea. Quarto
de
Roger. Roger está deitado na cama, olhando para o teto,
com
uma expressão de puro abatimento. A câmera se movimenta
até a porta. Ela abre e Livia
aparece, entrando devagar no quarto. Música: Susie Suh -
Light On My
Shoulder LIVIA:
Oi meu
amor. ROGER:
Hei
Liv. LIVIA:
Você quer dar uma arejada... Sair do quarto um pouco? ROGER:
Obrigado... Mas acho que prefiro ficar aqui mesmo. Livia
o encara tristemente por alguns segundos. Ela se aproxima
e se senta na
cama. LIVIA:
Eu
não sei o que posso fazer para que você se sinta um
pouquinho melhor... Eu queria fazer algo, mas não sei o
quê. ROGER:
Eu
agradeço sua atenção, sua
preocupação... Mas não há nada, nada mesmo
que possa fazer para que mude um pouco a dor que estou
sentindo agora. LIVIA:
Eu
sei que não... E se preferir ficar sozinho, eu vou entender. Mas se
precisar de
mim, a qualquer momento, qualquer hora, mesmo que seja de
madrugada, eu
estarei pra ti, okay? Roger
concorda
com a cabeça. Livia se
inclina e beija carinhosamente o rosto dele. Ela levanta e
vai
até a porta. Roger levanta e senta na cama. ROGER:
A vida
é tão injusta. Como uma coisa dessas pôde acontecer
com uma pessoa tão boa? LIVIA:
Eu sei
que você se questiona e quer alguma resposta... Mas
infelizmente
elas não existem. Coisa ruins acontecem o tempo todo. ROGER:
(indignado)
Ela
mal come, não dorme, fica vagando pela casa... E sabe quando
você acorda no meio da noite, suado, com o coração
acelerado e respira aliviado, agradecendo a Deus por ter
sido apenas um
sonho ruim? Close
no
rosto de Livia que acena de
leve com a
cabeça. Roger a olha tristemente. ROGER:
Eu
estou esperando acordar. LIVIA:
(se
ajoelhando na frente dele) Não carregue esse fardo todo
sozinho... (segura nas mãos dele) Divida comigo. ROGER:
(após alguns segundos) Fica aqui comigo um pouco. Ele
volta
a deitar na cama e abre o braço. Livia
levanta e se deita, colocando a cabeça no peito dele. Ela
acaricia os cabelos do namorado, enquanto Roger volta a
olhar para o
teto. Casa
de
Cláudio. Lucio está deitado no sofá. Sua
expressão é de tristeza. Silvia aparece e se senta,
colocando a perna dele em seu colo. Cont. Susie Suh
- Light On
My Shoulder SILVIA:
O Lucas
pegou no sono. LUCIO:
Que
bom... SILVIA:
(após alguns segundos) Você está bem? LUCIO:
Quando
descemos do carro, ela apertou forte a minha mão, implorando
para que eu não deixasse nada acontecer ao seu neném...
(abaixa o olhar) E eu disse que tudo ia ficar bem. SILVIA:
Lucio,
você fez tudo que podia ser feito. E qualquer um no seu
lugar
diria a mesma coisa. LUCIO:
Mesmo
assim, essa imagem desesperadora não sai da minha cabeça.
Ali ela não se importava mais com usa vida, contanto que a
criança sobrevivesse. SILVIA:
(balançando a cabeça, em reprovação)
Há coisas que me parecem imagináveis... Perder um filho
em final de gestação, ou nos primeiros anos de vida,
é uma delas. Deve ser uma dor que não eu não seria
capaz de suportar, especialmente por saber que os filhos são
a
razão completa e nossa existência. (respira
fundo) A lei natural da vida dita que os pais devem partir
antes dos
filhos... Essa premissa jamais deveria ser quebrada... Jamais. LUCIO:
(entristecido) Jamais. Silvia
olha
para a frente, pensativa por alguns instantes. Lucio abre
os
braços. Silvia o olha e esboça um leve sorriso,
deitando-se no peito dele. Ele acaricia os cabelos dela,
enquanto a câmera vai se afastando lentamente. Casa
de
Roger. Vera está na cozinha, lavando a louça. Ela
aparenta estar bem concentrada no que faz. Segundos
depois, o prato cai
na paia, quebrando-se com a queda. Ela passa o braço na
testa e
olha para cima, respirando fundo. Arthur aparece, se
aproximando
rapidamente. Cont. Susie Suh - Light On My Shoulder
ARTHUR:
(preocupado) O que aconteceu? VERA:
Um
prato escorregou. Ela
começa
a juntar os cacos. Arthur tenta tomar a frente. ARTHUR:
Deixa
que eu faço isso. VERA:
(determinada) Não, eu faço. ARTHUR:
(pegando os cacos) Deixa apenas eu... VERA:
(interrompendo, exaltada) Eu já disse que eu faço!
Arthur
se
afasta alguns centímetros, mas continua a olhá-la.
Vera volta a juntar os cacos. ARTHUR:
Você não precisa se fingir de forte. VERA:
Decida
o que você quer, Arthur. Que eu fique deitada aos prantos ou
levante e faça alguma coisa. ARTHUR:
Você entendeu errado... Todos nós estamos sofrendo, Vera.
Se soubesse como meu coração está em
pedaços... VERA:
(encarando-o seriamente) Espero que esteja mesmo, já que
isso
tudo foi culpa sua. ARTHUR:
(em
choque) O quê? VERA:
Se
não fosse um covarde e não tivesse travado na hora em que
comecei a perder sangue, talvez meu filho estaria aqui
comigo agora. Arthur
fica
sem respostas. Seus olhos começam a brilhar. Vera o encara
com sinal de condenação e segundos depois sai da cozinha.
Arthur continua no mesmo lugar. Seus lábios começam a
tremer. A tela escurece. Abre
mostrando
Nicole no quarto, sentada de frente para o espelho,
penteando
o cabelo. Ela olha para o reflexo de alguém e sorri. A
câmera se movimenta mostrando Gabriel encostado na porta
que
está aberta. Ele sorri levemente, desencosta e vai até
ela. Música:
Jeff
Buckley - Hallelujah GABRIEL:
Você está bem? NICOLE:
(concordando com a cabeça) Uhum,
estou sim. Gabriel
se
senta na cama. Nicole para de pentear o cabelo e se vira
para ele. NICOLE:
Na
verdade, não muito. Os gritos e choros dentro do carro
não param de ecoar nos meus ouvidos. Meu coração
acelera quando chego a pensar. GABRIEL:
Você está impressionada com tudo que aconteceu. Todos
nós estamos. Cinco minutos atrás eles estavam felizes,
dizendo que o ar fez bem ao bebê, pra mais tarde estarem
chorando
com a perda dele. É surreal. NICOLE:
(sentida) Só espero que eles consigam encontrar conforto de
alguma forma. GABRIEL:
Eu
também... Breve
silêncio
por alguns instantes. Ambos ficam expressivos. Gabriel
levanta. GABRIEL:
Bom,
você deve estar querendo ficar sozinha. Estarei no meu
quarto se
precisar de mim. Ele
caminha
até a porta. Nicole levanta. NICOLE:
Espera... Fica mais um pouco. Conversa comigo. Gabriel
sorri
e volta para a cama, sentando de frente para ela. Eles
começam a dialogar, mas o som encobre o que eles dizem. A
câmera começa a se afastar, ao mesmo tempo em que a imagem
transparece, transitando de cena. Vera
está
no quarto, sentada na beirada da cama. Roger se aproxima
sorrateiramente, levantando a mão para tocá-la. Cont.
Jeff
Buckley – Hallelujah VERA:
(sem
olhá-lo) Eu quero ficar sozinha. Roger
para
e fica olhando-a por alguns segundos. Depois se aproxima
mais. ROGER:
Mãe... VERA:
(em tom
mais agressivo) Eu quero ficar sozinha! Roger
para
imediatamente, abaixando a mão. Vera abaixa o olhar. VERA:
(em
tom
mais calmo) Por favor... ROGER:
(fechando os olhos) Okay... Eu
te amo. Ele
sai do quarto. A câmera se aproxima de Vera, focalizando seu
rosto. Um leve sorriso se forma em seus lábios, enquanto segura
delicadamente uma roupinha de bebê entre suas mãos
trêmulas. Com carinho, ela aproxima a roupa do rosto, inspirando
profundamente.Seus olhos se fecham, e instantes depois, lágrimas
começam a escorrer por suas bochechas. Um
bar.
Arthur está sentado, cabisbaixo, próximo a um
balcão. Na sua frente tem um copo cheio de cerveja. Lucio
aparece e senta ao lado dele. Cont.
Jeff
Buckley – Hallelujah LUCIO:
Oi
Arthur. ARTHUR:
Obrigado por ter vindo, Lucio. Eu estava precisando
conversar com
alguém antes de pular da ponte mais alta da cidade. LUCIO:
Por
favor, nem brinque com isso. ARTHUR:
(choroso) A Vera me culpa por tudo o que aconteceu... E como
não
culparia? Eu travei no momento mais crucial de nossas vidas.
Que tipo
de homem eu sou? LUCIO:
(solidário) Hei, não se torture desse jeito... Você
entrou em choque. Acontece com muita gente. ARTHUR:
(batendo no balcão) Mas não devia ter acontecido comigo!
Eu que deveria protegê-la... Eu que deveria segurar ter
segurado
na mão dela. LUCIO:
Arthur,
você parou por pouquíssimos segundos. Nós
estávamos logo atrás de você. O que aconteceu,
infelizmente teria acontecido se você não tivesse parado.
Pare de se culpar por isso. ARTHUR:
Nós não podemos ter certeza, Lucio. LUCIO:
Mas
é a verdade... No momento em que ela começou a perder
sangue, a situação já estava crítica. ARTHUR:
(após alguns segundos) O Roger não falou comigo desde que
voltamos do hospital. Seus olhos deixam claro o
desapontamento, a
ira... Como não me torturar com um fato que deixa claro quem
é o vilão de tudo? LUCIO:
Escute... Sua esposa está vulnerável. É normal que
ela queira encontrar um culpado. É mais fácil enfrentar
os estágios da perda dessa forma. Mas no fundo, ela sabe que
não há culpa a ser atribuída, embora talvez pense
que poderia ter feito algo para evitar aquele momento... Quanto ao
Roger, bem, ele só está confuso, é
compreensível, afinal, ele ainda é um adolescente. Arthur
passa
a mão no rosto, entristecido. Lucio o olha por alguns
segundos. LUCIO:
Sendo a
mais frágil, ela vai precisa muito de você... (empurra o
copo) Sóbrio. ARTHUR:
Eu
só pedi isso aí, mas não tomei uma gota. Eu
não posso. LUCIO:
Ótimo... Agora vem, vamos pra casa. Apenas, deixe-a viver
esse
período de luto. Serão meses difíceis, mas se
permita agora chorar um pouco. Você precisa disso. O
som preenche o ambiente. Arthur concorda com a cabeça, mostrando
que entendeu. Eles se levantam, apoiando-se mutuamente, e caminham em
direção à saída. Lucio coloca a mão
carinhosamente no ombro de Arthur, demonstrando apoio. A câmera
permanece fixa no lugar, observando-os passarem pela porta, seguindo o
seu caminho. Quarto
de
Roger. Roger está encostado na janela, olhando para fora.
É noite. Ouve-se duas batidas na porta. Roger ignora.
Segundos
depois ela abre e Cláudio aparece. Música: Michael Andrews - Mad World CLÁUDIO:
Posso
entrar? ROGER:
(sem
olhá-lo) Desde quando você precisa de permissão
para isso? Cláudio
acena
com a cabeça e entra. Ele senta na cama, enquanto Roger
continua na mesma posição, na janela. CLÁUDIO:
Desculpe por não ter vindo antes... Sinceramente, fiquei
buscando palavras, algo que não soasse clichê e pudesse,
sei lá, trazer algum conforto. Mas a verdade é que
não existe nada que eu possa dizer que vá aliviar sua
dor, meu amigo. Só posso dizer que sinto muito, de todo
coração. ROGER:
Está tudo bem... Eu no seu lugar não teria nada
também. CLÁUDIO:
Não está. Você é meu irmão e é
meu dever estar contigo nesse momento ruim que está
vivendo...
Mas quero que saiba, que vocês sempre foram minha segunda
família e sua dor, é minha dor. ROGER:
(virando-se para ele, com olhos cheios de angústia) Como pode
Deus permitir que uma criança que sequer teve o primeiro suspiro
de vida venha a falecer? Qual o propósito disso? Por que fazer
milhares de famílias sofrerem, para quê? (indignado)
Enquanto pais abandonam seus filhos, os jogam em lagos, os deixam em
lixeiras para morrerem, quem ama incondicionalmente os perde. É
simplesmente insuportável. Não consigo aceitar uma coisa
dessas. Eu não posso... é demais para suportar. CLÁUDIO:
Eu acredito em Deus... Mas entender o que acontece nesse mundo é
algo que vai além da nossa compreensão. Às vezes,
somos confrontados com situações tão dolorosas e
injustas que fica difícil encontrar um sentido para tudo isso. E
é perfeitamente normal sentir raiva, revolta e questionar os
propósitos divinos diante de uma perda tão devastadora.
Mas acredite, mesmo nos momentos mais obscuros, Deus está
presente, segurando a sua mão e enxugando suas lágrimas. ROGER:
(entristecido) Eles queriam tanto ter outro filho. Estavam
tão
felizes com a chegado do Cayro...
Por
quê? CLÁUDIO:
(com os
olhos brilhando) Eu não sei, meu amigo... Eu não sei...
(levanta e se aproxima) Mas de uma coisa eu sei... Eu estou
aqui. E
não vou deixar que sofra sozinho, okay? Roger
acena
com a cabeça e sorri de leve. Cláudio toca o ombro
dele e aperta. CLÁUDIO:
A turma
vai se encontrar na praça logo mais... Você não
quer ir, tentar aliviar um pouco a mente? ROGER:
Obrigado... Mas eu prefiro ficar sozinho pelo menos por
hoje... Se
não se importa? CLÁUDIO:
Claro que não,
eu entendo... Mas não se esqueça, eu estou à sua
disposição. Me ligue se precisar de qualquer coisa,
tá certo? Roger
novamente
acena com a cabeça. Cláudio se aproxima mais e
lhe dá um forte abraço. Em seguida o olha uma
última vez e sai do quarto. A câmera permanece no quarto.
Roger olha para cima e senta na cama. Quarto
de
Vera e Arthur. Vera está deitada na cama, aparentemente
dormindo. A câmera se move até a porta, mostrando Arthur
entrando. Ele a olha por alguns segundos e depois se
inclina, puxando
um lençol e cobrindo-a. Ele passa a mão no rosto dela e
depois a beija com ternura. Segundos depois caminha até a
janela. Ouve-se um som de carro
freando. Música:
Snow Patrol
- Run ARTHUR:
(em
off, voz ecoada) Meu Deus. ROGER:
(em
off, voz ecoada) Por que você parou? Segue logo com essa
droga de carro! Precisamos de um hospital... Os
olhos
de Arthur começam a se encher de lágrimas. Ele olha
para Vera que continua dormindo. Ele senta na beirada da
cama, coloca
as mãos no rosto e começa a chorar amargamente. A
câmera começa se distanciar devagar, mostrando-o aos
prantos por alguns instantes. Ao
som
da mesma música, a imagem transparece para dentro do
quarto
de Roger. Ele continua sentado na cama, perdido. Após
alguns
segundos, ele olha para a mesinha do computador e fica
pensativo.
Esboça um leve sorriso e levanta, saindo do quarto. A
câmera permanece no mesmo ambiente e se movimenta até a
mesinha, focando em um porta-retratos com a foto de Roger
e Livia juntos. Ele está
sorrindo e ela
está beijando a bochecha dele. A tela escurece segundos
depois. Abre
mostrando
Gustavo sentado no banco da praça do centro. Ele se
mostra bastante pensativo. Cláudio aparece e se senta ao
lado
dele. Música:
The
Fray - How
To Save
A Life CLÁUDIO:
Hei... GUSTAVO:
Hei...
O que faz aqui sozinho? Cadê nossa amiga em comum? CLÁUDIO:
Está ali na casa dela tomando banho. Eu disse que esperaria
na
praça, já que marcamos com o Felipe e os outros. Mas por
enquanto só encontrei você aí, perdido. GUSTAVO:
Eu
estava pensando em algumas coisas. CLÁUDIO:
(após alguns segundos) Eu vi que você ficou bastante
impressionado com o que aconteceu... Disse poucas palavras
desde que
voltamos... E isso é uma coisa muito, muito rara. GUSTAVO:
Fiquei
pensando em como tudo vai ser diferente para eles daqui pra
frente. Era
família tão feliz... Acho que a mais feliz que eu
já conheci. Ela não merecia isso... A vida nunca deveria
ser amarga desse jeito. CLÁUDIO:
É difícil aceitar uma tragédia em todos os
sentidos... Seja pai, filho, um amigo, o que for. É complicado. Nesse
instante,
Helen aparece, se aproximando dos dois. Ela franze as
sobrancelhas, estranhando. HELEN:
(estranhando) É uma miragem ou vocês dois estão
mesmo juntos, conversando civilizadamente sem que estejam
alcoolizados? GUSTAVO:
(sorrindo) Qual é, somos homens civilizados. Você
já devia saber disso. CLÁUDIO:
(sorrindo) E de vez em quando é possível nos suportarmos.
Mas só de vez em quando. GUSTAVO:
Concordo. Seria estranho nos tornarmos grandes amigos. CLÁUDIO:
Não é pra gente uma coisa dessas. Helen
sorri
e se senta no meio de ambos, apoiando os braços de cada
um. HELEN:
Seja
qual o motivo, eu sei que vou ganhar muito perto dos meus
dois grandes
amigos. CLÁUDIO:
(para
Gustavo) Ela disse isso, mas vamos deixa algo bem claro
aqui... Eu sou
o preferido. GUSTAVO:
Óbvio que não. Se formos registrar tudo que eu e Helen
já passamos juntos, daria um livro. Então, claro que o
preferido sou eu. CLÁUDIO:
E tudo
que já passamos juntos, daria mais que um livro, daria
livros,
versões cinematográficas, séries televisivas...
Conta pra ele, Helen... Helen
começa
a rir, enquanto Cláudio e Gustavo continuam a
discutir, de forma amigável. O som aumenta e encobre o que
eles
dizem. A câmera se afasta, ao mesmo tempo em que a imagem
transparece. Frente
da
casa de Livia. Roger está
encostado em seu carro, com as mãos no bolso. Livia aparece. Cont. The Fray - How to Save A Life ROGER: Você tinha
razão... Eu
não
posso sofrer sozinho e preciso dividir essa dor com
você... Ele
abaixa
o olhar e seus lábios começam a tremer, se
segurando para não chorar. Livia
o
olha com compaixão. Roger levanta os olhos, lacrimejando.
ROGER:
Eu
estou apavorado, Livia. Estou
com medo do
que será de nossas vidas depois do que aconteceu. Tenho medo
da
minha mãe fazer algum tipo de loucura. Tenho medo do meu pai
não saber lhe dar o suporte necessário... Eu estou com
medo... As
lágrimas
de seus olhos começam a escorrer. Livia
se segura para não chorar. ROGER:
Nunca
passei por uma prova desse jeito e morro de medo das
consequências... (começa a chorar) Medo de ficar sozinho. LIVIA:
(se
aproximando) Vem cá... Ela
o
abraça fortemente, enquanto Roger desaba a chorar. LIVIA:
Você nunca estará sozinho, porque aconteça o que
acontecer, eu estarei com você... (passa a mão no cabelo
dele) Mas agora é tempo de chorar, meu amor... Então
chora, chora bastante. Coloca tudo pra fora. A
câmera foca o rosto de Roger, que chora com ainda mais
amargor.
Close no rosto de Livia que
fecha os
olhos, que também chora. Lentamente a câmera
se afasta, subindo ao céu estrelado. Aos
poucos
começa a amanhecer e quando desce, temos uma visão
aérea do condomínio. Transparece para a casa de Roger,
cortando para dentro do quarto de Vera. Arthur está de
olhos
fechados. Após alguns segundos ele abre os olhos e a
câmera abre, mostrando-o deitado sozinho na cama. Ele olha
para o
lado, levanta e vai até a porta. A câmera o segue,
caminhando pelo corredor. Música:
Third Day - Offering CLÁUDIO:
(em
off) A morte é sempre o limite para o qual não
estamos preparados... Seja a de um filho, seja a dos
pais... Arthur
chega
até uma porta. A câmera corta para dentro, mostrando
Vera em pé, balançando um berço como se estivesse
fazendo uma criança dormir. A câmera se aproxima
lentamente do rosto de Arthur. CLÁUDIO:
(em
off) Os limites da coragem são constantemente desafiados
nestas alturas. E só o amor é maior que tudo o mais...
Mesmo a morte. Cemitério.
Roger
está parado em frente ao túmulo de seu
irmão. Olhando tristemente para a lápide. Cont.
Third Day - Offering Nesse
instante, a tela é tomada por alguns flashes de Vera e Arthur
durante a temporada, momentos felizes, sorrindo, Vera alisando a
barriga de grávida. Eles escolhendo o nome da criança por
sorteio. A cena volta para Roger no cemitério, seus olhos
lacrimejam. Atrás dele, vemos Amanda se aproximando devagar. Ela
para ao seu lado. Eles se olham por alguns instantes e depois seus
olhos se voltam para a lápide. CRÉDITOS
FINAIS: CRIADO
E
ESCRITO POR: Thiago
Monteiro PARTICIPAÇÕES
ESPECIAIS Jesse
McCartney
como Davi MÚSICA TEMA Switchfoot - Meant To Live TRILHA SONORA Max Richter - On the Nature of Daylight Gavin DeGraw - We
Belong Together Radiohead - High And Dry Susie Suh - Light
On My Shoulder Jeff
Buckley - Hallelujah Michael Andrews - Mad World Snow Patrol - Run The
Fray - How to Save A Life Third
Day - Offering |